sábado, 4 de fevereiro de 2012

A abertura do ano judiciário de 2012 (parte II)

Traduzindo o recado, o sentimento de impunidade que campeia no país se deve, em síntese, à Polícia (órgão de investigação) e ao Ministério Público (titular da acusação). Nada de ruim pode ser imputado ao Poder Judiciário. Péééééém. Mandou mal, Excelência. Vamos recapitular algumas cositas.

Até pouco tempo atrás, uma lei dizia que autores de crimes hediondos - chamemo-os simplesmente de facínoras - deveriam cumprir a pena integralmente presos, isto é, sem direito àquele "descontaço" a que eu já me referi em um post anterior. A Justiça criminal (no caso, o STF) - que, conforme o próprio ministro, deve julgar segundo a lei - disse que essa lei não valia e que esses criminosos poderiam sair do regime fechado após cumprirem 16% da pena. Quem quiser conferir, basta ler a íntegra do Habeas Corpus nº 82.959, julgado em 26 de fevereiro de 2006.

Em outro caso, a Justiça criminal (de novo o STF), entendeu que um sujeito condenado em 1º e 2º graus - ou seja, que teve o processo examinado por, no mínimo, 4 (quatro) juízes diferentes, em 2 (duas) instâncias - não pode ser preso, caso tenha interposto recurso especial ou extraordinário. Essa mesma Justiça - que, conforme o ministro, deve julgar segundo a lei - afirmou que não era válida a lei que dizia que recursos extraordinários e especiais não possuem efeito suspensivo, isto é, não impedem o cumprimento das decisões de 1ª e 2ª instâncias. Na prática, isso quer dizer que, para o STF, as decisões dos juízes singulares e dos Tribunais de Justiça valem tanto quanto uma nota de R$3,00 (três reais). Os interessados podem conferir o Habeas Corpus nº 84.078, julgado em 05 de fevereiro de 2009.

Mais um exemplo: a Lei 11.343/06 proíbe que o condenado por tráfico de drogas tenha a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos (isto é, prestação de serviços em creches, escolas, prestação pecuniária, entre outras). A Justiça criminal - de novo o STF, vejam que coincidência! - afirmou que essa parte da lei não é válida. O leading case foi o Habeas Corpus nº 97.256, julgado em 01º de setembro de 2010.

Vamos adiante. Um estudo elaborado pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) constatou que entre 15 de dezembro de 1988 e 15 de junho de 2007 - um breve período de quase 20 (vinte) anos -, o STF não condenou um único político possuidor de foro privilegiado (p. ex., deputado federal, senador, ministro de Estado, etc.). E olhe que não foi por falta de oportunidade, já que nesse período tramitaram ali cerca de 130 (cento e trinta) ações penais. Tudo bem que a Justiça criminal não existe só para condenar, mas se de 130 (cento e trinta) não dá pra pegar unzinho que seja, então nossos inocentes políticos estão sendo vítimas de um complô acusatório.

A esses casos poderíamos acrescentar dezenas de outros - a anulação da "Operação Boi Barrica", que comprometia o filho do presidente do Senado, José Sarney, a anulação da "Operação Castelo de Areia", que descobriu um forte esquema de doações irregulares feitas a políticos (o popular "caixa 2"), a soltura do médico Roger Abdelmassih, que, após um habeas corpus do STF, fugiu levando na bagagem uma condenação de 278 (duzentos e setenta e oito) anos de prisão pela prática de 56 (cinqüenta e seis) estupros cometidos contra pacientes dopadas, e por aí vai. Tudo isso obra da Justiça (?) criminal.

Nenhum comentário: